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Luta de agricultores pela retomada das terras no Açu continua

Por Equipe Marcelo Freixo

Os pequenos agricultores e pescadores do quinto distrito de São João da Barra, no Norte do estado, conquistaram mais uma importante vitória na luta pela retomada de suas terras, desapropriadas em 2008 e 2009 para a construção do Porto do Açu. Em audiência pública realizada na manhã desta quinta-feira (08), na Assembleia Legislativa, foi decidido que será criado um grupo de trabalho, formado por parlamentares e trabalhadores, para pensar soluções e viabilizar o retorno dos agricultores para suas casas.

Além de representantes da Defensoria Pública, pesquisadores, integrantes do MST, dezenas de trabalhadores participaram da audiência. Noêmia Magalhães falou da luta que dura quase dez anos e lembrou dos companheiros e companheiras que não resistiram à dor de serem expulsos de suas terras.

“Além de expropriar nossas terras, expropriaram nossas vidas, nossos sonhos, nossa história. Não foi fácil acompanhar o adoecimento de seu Aloísio. Depois de perder a terra, ele perdeu a saúde e o sofrimento o levou à morte. Gostaria de lembrar dona Maura. Depois de ser retirada por mais de 80 policiais, ela foi internada num sanatório. Há três meses nos deixou. Dona Rute também morreu. Funcionários do Estado a levaram para tomar cafezinho e quando ela voltou tinham derrubado sua casa”, afirmou.

Rodrigo Santos, que também é agricultor, falou sobre as dificuldades das famílas, que perderem sua fonte de sustento, e a devastação ambiental provocada pelo empreendimento. Ele contou que a região era a maior produtora de maxixe do estado e segunda maior de abacaxi. As quedas nas safras dessa fruta desde a construção no porto foram de 85%.

“A agricultura é familiar. São pequenos módulos rurais que não passam de dois quilômetros quadrados. Famílias com seis a oito filhos que detinham pequenas áreas. Os produtores sempre preservaram a restinga e os rios. Agora, o leito do lençol freático foi salinizado, produção dizimada, as famílias perderam capacidade de transformar terra em produtos para as mesas dos senhores e do estado”, lamentou.

Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Marcelo Freixo argumentou que a luta pela anulação dos decretos de desapropriação não é um embate entre governo e oposição. “A gente quer que o decreto seja anulado. Isso cabe a essa Casa. Nesse sentido, é importante dizer que muitos deputados são simpáticos à causa, inclusive da base do governo. Não se trata de uma bandeira da oposição contra o governo. A gente precisa chegar a esse entendimento. Pessoas tiveram suas casas destruídas, suas terras tomadas e morreram. Morreram de dor e de injustiça”, concluiu.

Histórico de violações

A retirada dos trabalhadores é resultado de negociata milionária entre o ex-governador Sérgio Cabral e Eike Batista. Em 2008 e 2009, decretos publicados por Cabral desapropriaram cerca de 90 quilômetros quadrados da região, que inclui área de restinga, onde viviam os agricultores em favor da Companhia de Desenvolvimento Industrial do estado (Codin) e da LLX, de Eike, empresa que capitaneou o empreendimento e depois foi incorporada pela Prumo.

Desde então a vida dos trabalhadores é de luta e martírio. Erros nas obras de construção do porto provocaram a salinização do solo e do Canal do Quitingute pela água do mar. O problema causou a perda de colheitas inteiras, grandes prejuízos e ameaçou a sobrevivência dos agricultores. Além disso, quase 90% das terras desapropriadas não foram usadas, estão abandonadas e não cumprem sua função social. Elas não estão de acordo nem com os objetivos definidos pelos decretos.

Unidos na luta pela recuperação de suas terras, as reivindicações dos lavradores ganharam ainda mais força após as revelações da Operação Lava Jato. Segundo as investigações, baseadas em depoimentos de Eike, o pagamento de propina de US$ 16,5 milhões pelo empresário a Cabral teve como contrapartida a expulsão dos agricultores.

Desde 19 de abril, cem famílias estão acampadas em suas terras para pressionar a Justiça pela anulação dos decretos de desapropriação. Em 12 de maio, eles conquistaram um importante vitória. O juiz Paulo Maurício Filho, da 1ª Vara de São João da Barra, negou o pedido de reintegração de posse feito pela Codin. Ele determinou prazo de 40 dias para que as partes entrem em acordo. Os trabalhadores, entretanto, exigem a retomada da posse de suas terras.