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Direitos Humanos e Segurança Pública

Nós vivemos uma crise na Segurança Pública. Como mostrou matéria publicada pelo jornal O Dia, nesta quinta-feira, somente no Estado do Rio, em média nove policiais militares foram assassinados por mês, em 2014. Até ontem, 103 trabalhadores da segurança haviam sido mortos. No ano passado, foram 111.

Este cenário reafirma a urgência de nós ampliarmos o diálogo com toda a sociedade sobre esta crise e as péssimas condições de trabalho dos PMs. Por isso, é lamentável ver o governador do Estado agir de forma imatura e oportunista ao atribuir um problema tão grave à atuação dos defensores dos Direitos Humanos.

Em vez de reafirmar o senso comum e acirrar os conflitos, o governador deveria se preocupar em trazer o debate sobre os Direitos Humanos para a sua política de Segurança Pública e para dentro da Polícia Militar. É desta forma que nós avançaremos na garantia dos direitos dos policias.

A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa, da qual sou presidente, procura as famílias dos policiais assassinados para viabilizar assistência psicológica, jurídica ou qualquer outra necessidade. Nem sempre conseguimos ter acesso aos parentes, em parte porque o antigo comando da PM não nos disponibilizou as informações. Mas ontem falei por telefone com o comandante-geral da PM, coronel Ibis Silva, para darmos o suporte necessário às famílias dos soldados Ryan Procópio e Anderson Freire.

Cito alguns exemplos para mostrar como a Comissão de Direitos Humanos atua. A policial Alda Rafael Castilho foi morta em fevereiro de 2014, aos 27 anos, no Parque Proletário. Nós procuramos seus familiares e garantimos tratamento psicológico num posto de saúde em Duque de Caxias, onde eles moram; articulamos o atendimento deles pelo Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Defensoria Pública do Rio de Janeiro e acompanhamos o atendimento jurídico junto aos advogados.

Nós também demos suporte à família do PM Rodrigo Paes Leme, assassinado aos 33 anos na Nova Brasília, em março deste ano. Entramos em contato com as mães dos filhos do policial e viabilizamos atendimento psicológico para as que o solicitaram. Uma delas pediu a revisão do seguro de vida de Rodrigo, e a Comissão a encaminhou ao Núcleo de Família da Defensoria Pública.

No caso do PM José Ricardo Moniz, encontrado morto em casa, em Bangu, no dia 11 de julho de 2014, a Comissão de Direitos Humanos atendeu os irmãos do policial e solicitou a cópia do inquérito para acompanhar a apuração do homicídio.

Em novembro do ano passado, o recruta Paulo Aparecido Lima, de 27 anos, morreu após uma sessão de treinamento no Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (Cfap). Sua turma foi submetida a exercícios que mais pareceram uma sessão de tortura. Além da morte de Paulo, outros 33 alunos precisaram de atendimento médico devido a queimaduras. A Comissão atuou no caso do recruta, acompanhou os depoimentos das vítimas e vistoriou as instalações do Cfap.

Em vez de fazer um discurso irresponsável, o governador poderia prestar contas das medidas que adotou para garantir os direitos das famílias dos trabalhadores assassinados. Por exemplo, o que a Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos tem feito? A família do recruta Paulo Aparecido, por exemplo, um ano após a sua morte, não recebe qualquer auxílio do Estado.

Em vez de bravatear, a principal preocupação de um chefe de Estado, responsável pela política de Segurança Pública, deveria ser a garantia das boas condições de trabalho e da segurança dos policiais militares, valorizando suas carreiras, pagando bons salários, dando uma formação adequada à defesa da cidadania e dos direitos humanos e garantindo mais democracia dentro da corporação.

Por exemplo, os policiais brasileiros morrem três vezes mais fora do horário de serviço. Devido às precárias condições de trabalho, eles são obrigados a recorrer aos chamados bicos, cuja situação é ainda mais precária. É fundamental a valorização salarial para que trabalhadores e trabalhadoras não tenham que expor suas vidas em empregos extras que não lhes dão segurança.

Precisamos superar o atual modelo de segurança, baseado na guerra, no militarismo e na eliminação do inimigo. Temos a polícia que mais mata e que mais morre. Não há vencedores nesta realidade insana. Por isso, a luta política é pedagógica, e este debate precisa ser feito pelo conjunto da sociedade de forma responsável. A defesa dos Direitos Humanos não pode ser algo alheio à vida dos policiais e à Segurança Pública, como se estivessem em lados opostos.