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Maracanazo de Cunha

A história do Maracanã se entrelaça à trajetória da cidade do Rio. Elas se misturam e confundem assim como a bola e as pernas tortas de Garrincha diante do marcador atônito. Mas as coincidências narrativas vão além das proezas dos deuses mundanos do futebol. Falar do Maraca é desvendar a alma da capital carioca.

Não a alma transcendente, dos milagres do gramado e da veneração das arquibancadas, mas a alma concreta. Aliás, alma-concreto, obra, cimento e privatização. Ao longo de suas transformações, o Maraca nos mostra por quem e para quem o Rio é feito. Ele reflete um projeto de cidade.

Quando o estádio começou a ser planejado, houve um grande debate que avançou para além da construção de um equipamento esportivo. Discutiu-se, sobretudo, uma concepção de cidade.

A escolha do local onde o Maraca foi erguido visava facilitar o acesso de pessoas de várias áreas do Rio. Suas dimensões e os espaços com preços populares permitiram receber muita gente de todas as classes sociais. O estádio espelhava a diversidade e as contradições de uma cidade que se congregava aos domingos num ritual ecumênico de devoção a Zico, Garrincha, Rivellino e Roberto Dinamite.

Hoje, além de não termos mais jogadores dessa estirpe, nos desencantamos porque o Maraca, privatizado, encarecido e transformado em butique, reflete outro projeto de Rio de Janeiro. Estádio e cidade são agora para poucos. Na arena da especulação imobiliária e das remoções, onde a força da grana destrói coisas belas, não há mais lugar para a paixão dos geraldinos, os fiéis romeiros da geral. Os preços os removeram para o insosso pay-per-view dos botequins.

Após a privatização, começamos a conhecer a privataria capitaneada por Eduardo Cunha e pelo PMDB do Rio.


A instalação dos mármores dos banheiros do estádio foi realizada pela empresa Guarujá Granitos, que está nos nomes de Marilene e Danielle Alves, mulher e filha de Altair Alves Pinto, homem de confiança de Cunha.

Segundo as investigações da Lava Jato, Altair seria o responsável por repassar a propina do esquema da Petrobras ao deputado.

O episódio mostra como Cunha e os governos do PMDB no município e no Estado se misturam. Danielle está lotada na Secretaria da Casa Civil da prefeitura, que era comandada por Pedro Paulo Carvalho, braço-direito de Eduardo Paes. Num surto de sinceridade, Paes admitiu que a nomeou a pedido de Cunha.

Tudo se mistura e se confunde, assim como a bola e as pernas tortas de Garrincha diante do marcador atônito. Tão difícil quanto saber para que lado o craque driblaria, é descobrir os limites do PMDB e de Cunha. Estamos assistindo a outro Maracanazo.